sexta-feira, 20 de março de 2020

A thread prometida,que acabei transformando em texto de blog por ser melhor e mais fácil de escrever.
(Posso incluir títulos conforme os dias vão passando--vou fazer isso em tweets/posts avulsos.
P.s.:Indico aquilo que eu vi/li ou estou vendo/lendo. Se você achar ruim ou bom,é com você mesmo.)

FILMES/DOCUMENTÁRIOS:
-O quinto elemento(Bruce Willis);
-Karate Kid;
-Rambo(qualquer um);
-São João Vianney(documentário);
-Pare senão mamãe atira;
-Santa Terezinha do Menino Jesus;
-Duro de Matar;
-São Pio de Pietrelcina;
-Homem de Ferro;
-Click.

SÉRIES/SERIADOS:

-Vikings;
-Breaking Bad;
-Band of Brothers;
-Sai de Baixo(espacinho pro sitcom nacional rs);
-Todo mundo odeia o Chris(não vejo há tempos,mas pode ir na fé...);
-Suits;
-Narcos(o da Colômbia);
-Chaves(vai rir até se ficar vendo o mesmo episódio por 30 anos em loop ininterrupto rs).

LIVROS:
-Ortodoxia(Chesterton);
-More guns,less crimes(John Lott Jr.);
-Muito barulho por nada(Shakespeare);
-Hamlet(Shakespeare);
-O auto da Compadecida(Ariano Suassuna);
-Triste fim de Policarpo Quaresma(Lima Barreto);
-Quincas Borba(Machado de Assis);
-Os Lusíadas(Camões. Pode também ler e tentar decorar alguns sonetos avulsos dele,como "Não pode tirar-me as esperanças" e "Quem diz que o Amor é falso");
-Mentiram pra mim sobre o desarmamento(Bene Barbosa e Flávio Quintela);
-Bíblia Sagrada.

Conforme eu for lembrando ou começando a conhecer e ler/ver,vou aumentando a lista.




domingo, 13 de outubro de 2019


A Indesejadinha
(Yan Marinho)

I
  Certa vez, um conhecido resolveu me contar sobre uma menina que morava em Campo Grande (do Rio de Janeiro, hein!?) e trabalhava com ele numa loja de celulares. Com os olhos arregalados e uma voz cheia de ar e tesão, ele me perguntava:
--Flávio, tu conhece a Priscilla, uma mina que trabalha comigo?
Como eu nunca conheci—ou não me lembrava de nenhuma—uma Priscilla funcionária de loja de celular­, virei para ele com cara de um espantado que não estava espantado e respondi a ele:
--Não, cara: não conheço.
  Ouvindo a minha resposta, ele se animou: virou seu rosto quase pretinho para a frente do meu e começou a contar:
--Aquele cabelão dela que vai nas costas; aquele shortinho que ela usa no uniforme mostrando a popa da bunda; aquela porra daquele sorriso matador...Puta que pariu! Rendo fácil pra ela...Ela pára a loja e deixa do chefe aos clientes tudo maluco.
Depois, puxou do bolso do bermudão azul o celular, acendeu a tela e mostrou a foto da tal Priscilla. Confesso que também me rendi e refém virei por alguns minutos. Enquanto ele mostrava a foto, lamentava, já com a voz em outro tom:
--Maluco, já mandei mensagem pra ela umas vinte vezes. Ela sempre diz que não tem tempo pra me ver...
Ao ouvir aquilo e ver as mensagens, minha paciência já baixou ao nível da escrotidão máxima, até que respondi:
--Ou ela tá te enrolando, tá com tempo sobrando e não quer te ver porra nenhuma!
--Tu tem razão, cara: essa mina tá é me enrolando. Mas eu não vou desistir de jeito nenhum...
Nessa hora, o caixa do banco o chamou para o atendimento; ele se levantou, bateu a mão dele com a minha em cumprimento e foi para o guichê.
Atenderam-me logo depois e segui para casa, porque eu não tinha nada mais para fazer naquele dia.


II
   Já eram dez da manhã do dia seguinte quando eu coloquei sebo na canela e corri loucamente para chegar à estação de trem e não perdê-lo (eu ganharia tranqüilamente os cem metros do Usain Bolt e do Asafa Powell com pelo menos uns três segundos de vantagem dos dois naquele dia!). Não adiantou nada: quando eu paguei a passagem e depois atravessei a catraca, já via os vagões na minha frente mexendo-se para a minha esquerda e indo para a Central do Brasil. Azar o meu!
Como o diacho do trem já tinha passado mesmo, não sobrou alternativa a não ser esperar na plataforma uns quinze minutos até vir o próximo—ou ir embora, mas eu não podia fazer isso de jeito nenhum.
Depois dessa eternidade tão curta, o trem chegou, parou e abriu suas portas diante de mim. Entrei um pouco rápido para não ser esmagado pela pressa de quem estava atrás de mim e fiquei em pé na frente de uma janela ensolarada, já que não havia lugar para sentar. De repente, olhei para uma certa menina, que teve mais sorte do que eu e estava sentada: shortinho mostrando um pouquinho que era bastante, cabelão para mais de metro e o tal sorriso matador. A foto de perfil (do In...) que meu conhecido mostrou enganava, mas não deixava a menor dúvida: era Priscilla mesmo que estava ali.

Ela pegou o celular da bolsa marrom, apertou o lado direito do aparelho e o acendeu.

O bicho da curiosidade me mordeu, aquele mesmo que faz muita gente virar os olhos e até o pescoço para ver o que está nas telas dos celulares dos outros nos trens, ônibus, metrôs e tantos outros lugares que só Deus sabe; aproveitei que ela sentou de um jeito tal que ela não podia me ver e fiz a observação curiosa por um bom tempo. Uma lista com umas cem mensagens—a maioria esmagadora, umas oitenta e tantas, da rapaziada louca para tirar uma provinha da fatalíssima morena—apareceu diante dos meus olhos e dos dela (apareceu bem mais para os meus que para os dela, garanto). Todo mundo ali naquela tela colorida e brilhante era Alberto, o meu conhecido; todo mundo ali tinha amor e malícia, mas cada um com a sua desconhecida medida dos dois.
O trem ora parava, ora andava fazendo um barulho seco e intermitente, parecendo uma curta rajada de tiros, vindo das rodas e acompanhado, vez ou outra, pelo chiado dos trilhos; chacoalhávamos à beça, mais que as bolinhas do sorteio da loteria. Enquanto isso, eu não tirava o olho (do celular) de Priscilla, a não ser rapidamente para dar uma disfarçada e admirar a belíssima paisagem que há, de ponta a ponta, nas linhas dos trens urbanos do estado do Rio de Janeiro.


A estação de Bangu já se aproximava de nós. A oportunidade de sentar se aproximava de mim: muita gente desembarcava nesse bairro, mais que nos outros por que eu tinha passado até então, deixando muitas cadeiras livres para esses mortais que seguiriam bem mais adiante. Sorte a minha!
Uma das cadeiras era justamente a que estava ao lado de Priscilla. Na janela, ainda por cima! Não perdi tempo: corri—naquela hora, bem menos do que o que eu havia corrido antes para chegar à estação de Campo Grande—e sentei-me ali.
Eu não era o caso de Benjamin Button, mas continuei sendo curioso. Mas eu tinha de ser um pouco mais comedido, discreto que antes: afinal, ia dar muito na cara, ela ia perceber e, provavelmente, ficaria revoltada comigo.
Ela me olhou rapidamente poucos segundos depois de eu ter sentado ali. Congelei. Virei picolé de gente, com ajudinha a mais do ar-condicionado. Contudo, meus pensamentos continuaram, e logo pensei que isso já tinha acontecido comigo em situações parecidas com outras pessoas, e que nada tinha a ver com uma percepção dela sobre a minha curiosidade. Quase voltei ao (meu) normal.

Ela olhou de novo logo depois. Dessa vez, pensei:--Puta que o pariu! Ela percebeu.

E realmente tinha percebido, mas ela não se revoltou: sorriu contidamente. Seu sorriso era dito matador, mas foi ele que me resgatou de vez da pequena morte que eu tivera ali. Rindo, e com a voz veludosa e baixada pela timidez, ela me disse:
--Oi.
As poucas nuvens do céu daquele dia pareciam pairar sob o sol da minha criatividade; estava nervoso, afinal, e ainda me acalmando. Assim, usei as mesmas palavras que ela para lhe responder.
Mais à vontade, contou-me sobre alguns detalhes da sua vida: era uma católica da média brasileira; vinha com ela uma Bíblia de bolso, já surrada pelo tempo e pelo intenso uso, pois ela a recebera da mãe ainda nas aulas de Catequese para a Primeira Eucaristia, mais ou menos com uns oito anos (ela tinha vinte e cinco), e um Rosário que mais enfeitava a bolsa do que acompanhava uma recitação dos Mistérios. Fazia curso técnico em Madureira e complementava a renda também como vendedora de cremes para os pés para ajudar os pais e o irmão de dez anos em casa.
Passada essa parte, não demoraria muito para que as lamentações viessem. Sem o muro do medo do desconhecido, ela despejou pelas belas vias de sua boca aquilo que devia estar alojado em seu imenso peito há um bom tempo:
--Olha, às vezes eu me sinto tão indesejada. Eu olho para o lado e vejo que ninguém me quer, ninguém tem desejo de me amar. Não sei mais o que faço!...

 Eu trouxe as sobrancelhas mais para baixo e fechei a testa disfarçadamente—mas, provavelmente, ela notou mesmo assim. Eu sabia que aquilo ali não era a realidade; apesar de eu mal a conhecer, sua caixa de mensagens no celular não mentia e me gritava com seu brilho de tela:--Você dificilmente vai ver ou saber de uma mulher tão desejada em toda a sua vida!...
Mas eu não podia dizer a verdade: a pouca intimidade não deixava. Ao menos não diretamente. Imagine se ela percebe que eu olhei o celular dela de longe!...
Tive ali pouquíssimos segundos para florear, quase que liricamente, um discurso sincero, mas que não a deixasse magoada com esta pobre alma que ela acabara de conhecer.
Assim eu fiz; aproveitando um pouco de sua fé cristã e de suas feições, que me pareciam muito caridosas, virei o rosto, olhei-lhe bem nos olhos e lhe disse:
--Garota, eu vou ser bem sincero contigo: você jamais estará sozinha. A Trindade, os anjos na sua hierarquia, os santos e a Virgem Maria sempre vão te acompanhar. Quanto aos deste mundo: já tentou olhar para as pessoas com mais atenção?  Contemplar cada gesto, cada olhar atentamente, como se fosse o último? Pois tente. Se você recebeu uma mensagem de um moleque te elogiando—moderadamente—,admire-a e responda ao cara. Você é exclamativa, chama a atenção por onde passa; dificilmente não existe alguém te querendo.
Depois disso, ela riu; seu riso tinha o volume baixado pela vergonha, e era prolongado pela falta do que dizer para mim. Passou mais ou menos um minuto, até que as palavras vieram novamente:
--Cara, valeu pelas palavras. Vou olhar melhor pras pessoas—e mais cuidadosamente, até pra não cair na lábia de caras que só querem uma noite na cama e nada mais—e aumentar minha fé. Se for olhar bem, é bem verdade isso aí que tu falou sobre os anjos, santos, Maria e Jesus; nunca estamos sozinhos!
--Você falou dos aproveitadores. É exatamente isso: também não é para ser aberta a qualquer malandro que chegar com papinho para te botar em cima da cama e da vara e, no dia seguinte, te abandonar na esquina mais próxima e nunca mais olhar na tua cara.
A partir daí, ela gargalhou, pois eu tinha ganhado subitamente um sentimento de intimidade de décadas de convivência; esqueci completamente a vergonha e que eu a tinha acabado de ver pela primeira vez pessoalmente.

O trem já vinha parando; a estação de Madureira se aproximava rapidamente, mas cada vez mais lento. Priscilla se levantou; era ali que ela tentava qualificar-se um pouco mais.
Despediu-se de mim com um breve aceno e saiu pelo lado direito da composição. Eu segui para a Central.
Dali, eu fiquei um bom tempo sem saber se ela só se impressionou naquele momento com o que eu disse ou se houve transformação real e profunda na vida dela. O que eu  esperava era só que ela aumentasse sua fé e passasse a se sentir menos indesejadinha...

quarta-feira, 31 de julho de 2019

Soneto ao som, ao cheiro e ao roubo


Preparai-vos, ó meros mortalíssimos
Olhos; entrar-vos-á tal grande furto;
Não espereis um justo e magno surto,
A retirar o roubo a que bem vimos.

Um estridente som, bem preto e rubro,
Pelo supremo rei soa em relvado,
Saqueia os pontos destro e bem malvado,
Garante a glória e diz:--Meu bem, te cubro!

Rouba o gostoso odor da glória alheia;
O vão achar-se empina grão nariz,
Que muitas vezes deita em mau cariz.

Do desonesto intento são bem cheias;
Linha lírica assento em amarelo,
Descortinando as luzes do castelo.

(Yan Marinho)

sábado, 4 de maio de 2019

Troque djá:A culpa é do técnico!

Depois de assistir deitado a uns vídeos no YouTube no meu celular,certo dia,levantei da cama e fui para a geladeira pegar um copo d'água. Afinal, o calor que fazia,típico do Rio, era um verdadeiro teste para as profundezas do Inferno. Enquanto passava a água da garrafa para o copo,pensei por alguns instantes no que um conhecido meu tinha dito numa mensagem alguns minutos  antes e que o povo do futebol costuma muito dizer:--Goleiro é uma posição ingrata!...

E é mesmo. Falha de goleiro,quando acontece,dá muito na cara(Sai daí,frangueiro filho da puta!).
Mais até que a de centroavante quando perde um gol quase feito dentro da pequena área.

Mas há uma outra,ainda mais ingrata:é exatamente aquela que fica pulando e gritando à beira do campo e orientando(ou tentando orientar) o time.

A barra de direção quebrou , um prego furou o pneu e o acidente aconteceu,mas o motorista é que foi de todo um safado,puto,imbecil,canalha.
A culpa quase nunca é das estrelas,nem daquelas que fazem corpo mole para derrubar treinador só porque os santos não bateram. Nem é,tampouco, de certas diretorias incompetentes e intocáveis que contraem dívidas--vou parar por aqui para não chamar o 190 e o Balanço Geral--e deixam os clubes ao ponto de ficarem sem sequer poder fazer brilhar à luz do sol suas pratas da casa por um pouco mais de tempo(muito menos poder contratar peças um pouco melhores),fazendo os treinadores terem de tirar leite de pedra.Enquanto isso, certos torcedores  tiram leite das picas de jogadores e diretores ineficientes,seja por amizade, por uma grana boa,por outra vantagenzinha qualquer e/ou simplesmente por uma cegueira que,(d)escrita,renderia bem mais do que um ensaio.

Não sou treinador e nem tenho vocação ou vontade de ser; muito menos acho que eles sejam totalmente vítimas nessa história. Há treinadores que fazem e fizeram,de fato,um péssimo trabalho--se não existisse nenhuma pessoa vendo,penso até que  a grama do estádio tranqüilamente lhes serviria de almoço ou jantar.
Existem aqueles que se deixam levar pelas pressões olhudas de certos empresários e diretores; fazem escalações e substituições que nem Freud(aliás,só o Senhor na Sua Onisciência) poderia explicar.

Torcedor,em qualquer lugar do mundo,é passional(e são exatamente as paixões--nem sempre ordenadas--que movem o futebol). Torcedor brasileiro também o é,e não precisa ser nenhum Gilberto Freyre para ver isso. Só que o brasileiro,além de exagerar na paixão,é imediatista(o que é um jeito especial de ser excessivamente apaixonado.Ligue djá!,Ganhe djá!).
Não só o torcedor,mas o povo como um todo,e isso só tem piorado--não juntamos dinheiro e esperamos para comprar um carrinho,mesmo mais simples,mas nos mergulhamos em financiamentos e dívidas para comprar um carro do ano,porque é totalmente imprescindível tê-lo agora,já!

(Calma,leitor nervosinho:eu sei que existem as exceções,e que até não são tão raras como parecem ser.)

Não esperamos juntar o dinheiro necessário,nem esperamos alguns meses para o trabalho de um técnico recém-chegado(quem sabe) consolidar-se,dar bons frutos.

Alex Ferguson treinou o Manchester United por quase trinta anos(vinte e sete,de 1986 a 2013). Você imagina alguém comandando um time por tanto tempo aqui no Brasil? Nem eu!
Contudo,alguém pode alegar:--Ferguson ganhou tudo! E ganhou tudo mesmo; foi um dos técnicos mais vencedores da história.
Mas quantos dos nossos Fergusons nós não matamos e estamos matando com as pedradas da pressa feroz?

Minha mãe diria que o apressado come cru. Eu vou além:o apressado,às vezes,nem come.




terça-feira, 23 de abril de 2019

Vídeo,Acerto,Rebuliço


Vídeo, Acerto ,Rebuliço
Yan Marinho

Há até não muito tempo, sua gloriosa e exclamativa ausência das quatro linhas brancas era o símbolo máximo do atraso do futebol em relação a alguns outros esportes, como vôlei e tênis; os apaixonados pela multiplicidade desportiva, tomados pela furiosa vontade comparativa, pediam calorosamente a vinda de algo que fosse ao menos parecido com os desafios, que, há algum tempo, já habitavam os hábitos de alguns torneios de vôlei e enxugavam das quadras a dúvida e a polêmica dos lances como aqueles que enxugavam o suor dos jogadores do piso nos intervalos entre—ou dentro dos—sets.

Eis que, numa explosão da criatividade tecnológica, surgiu o VAR—Video Assistant Referee, ou Árbitro Assistente de Vídeo --, que veio com similares objetivos para o futebol. Sua data de nascimento é nublada pela incerteza, mas o espanhol Francisco López diz ter sido o primeiro na história do futebol a apresentar um projeto chamado El futbol del siglo XXI: Tecnología de futuro para los equipos arbitrales (O futebol do século XXI: Tecnologia do futuro para as equipes de arbitragem) em 1999. A invenção do projeto de López teria um sistema composto por monitores—que recuperariam as imagens vindas do campo—e uma comunicação via rádio com os árbitros no campo em certas situações do jogo. Este sistema ficaria numa sala de controle e, por ser parecido com o que vem sendo implantado, criou uma disputa judicial entre a FIFA e Francisco, que quer quinze milhões de euros pelo uso do VAR e diz ter todas as provas de ter sido criativo, incluindo registros de propriedade intelectual.[1]

Admitindo que López realmente tenha sido o criador do VAR, a magnífica idéia repousou num sono que quase completou a maioridade--dezessete longuíssimos anos!--, entre alguns pequenos e noturnos despertares ali e acolá no começo da década de 2010; na mesma década, em 2016, ela resolveu levantar e aparecer na janela iluminada pelos refletores e contemplada pelos olhos do mundo nos EUA, ainda com os passos preguiçosos de quem acabou de acordar; nos anos seguintes, já mais acordada, na Europa, na Copa do Mundo, e em certos torneios regionais do Brasil.

O principal objetivo de o  VAR ter sido criado e (tão tardiamente) colocado para funcionar é trazer(um pouco de) justiça para um esporte já manchado por vários casos de manipulação de resultados—algumas vezes, bem sem-vergonha, explícita, descarada mesmo!—, a ruim e velha roubalheira.



Mas vou ser sincero com você que parou para ler estas linhas: não creio que Themis descerá do Olimpo, vai dar um beijo helênico nos bilhões de amantes e acompanhantes do futebol e colocará todos os lances polêmicos do ludopédio na sua divina balança, tornando cada estádio um pedacinho dos Campos Elísios; afinal, o falho e corrompível homem ainda está ali, na frente das telas que revisam os lances, ainda que possa ser amarrado pela vergonha numa possível tentativa de roubar ou mesmo num erro grosseiro.

Contudo,vendo algumas confusões e demoras que atrapalharam--e muito!-- o andamento de algumas partidas(Zidane chegou a dizer,como técnico do Real Madrid e com certa razão,que o VAR era fonte de confusão!),sugiro algumas modificações que poderão fazer com que a divindade dê ao menos um aceno olímpico para todos que compõem o futebol,deixando tudo um pouco mais justo e fluido:

1)Uma vez que o VAR pode ser usado em só quatro tipos de lances--e quase nenhum é interpretativo--,o árbitro de vídeo poderia ter poder de decidir e anular erros independentemente do árbitro principal de campo quando o lance não fosse interpretativo. Eu sei,eu sei,isso faria com que o A da sigla VAR perdesse todo o sentido(passaria a ser,de fato,um árbitro de vídeo,não um árbitro assistente de vídeo) e poderia causar alguns problemas,passando pela falta de transparência e até a desmoralização dos árbitros de campo--como se,em alguns casos,fosse possível desmoralizar mais,mas isso é outra história. Por isso,proponho a exibição detalhada da decisão sobre o erro/dúvida nos telões dos estádios e nas transmissões de TV,dando mais transparência ao processo;

2) Prosseguimento da partida enquanto o erro/dúvida é revisto(a):deixaria o jogo mais fluido,e evitaria as longas paradas--algumas chegando a até cinco(!) minutos. A decisão seria informada pelo telão e pela transmissão com a bola rolando,conforme o número 1;

3)Os capitães e os técnicos dos times(e ninguém mais!) poderiam pedir revisão do árbitro de vídeo caso tivessem dúvidas,exatamente como já há em torneios de vôlei; o delegado da partida ou o quarto árbitro julgaria se o pedido é válido ou não. Contudo,para não prejudicar o andamento da partida(conforme o número 2),o número de vezes em que se poderia pedir revisão teria de ser extremamente limitado(duas vezes por tempo,ou mesmo por partida,somados os pedidos de capitães e técnicos. Havendo prorrogação,o número poderia aumentar para três ou mesmo quatro se a quantidade de dois pedidos fosse considerada por partida,e não por cada tempo.)

Durante a sua leitura,podem vir muitas outras propostas--umas melhores,outras nem tanto--,mas essas são as que eu penso ser fundamentais para que o VAR seja fonte de mais acertos e menos rebuliços em meio a todos esses vídeos e olhos tão tensos e vidrados.



Notas:
[1] https://www.marca.com/en/world-cup/2018/06/30/5b376a3e268e3e09138b45d8.html



quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Um tiozão no Planalto


Candidato,
  Tenho vinte—quase vinte e um—anos e, por uns dez deles, vi, por muitas vezes, o triunfo dos malandros, dos ardilosos e dos ímpios em geral por toda a parte. Quantas dessas vezes pensei que o bem jamais venceria e que o mal daria sempre a tônica deste Vale de Lágrimas—algum tempo depois, acabei  me convencendo que este mundo é mais ou menos por aí mesmo!...
  Ao final de uma rotina recheada por essas tristezas—e por alegrias também, por que não?—eu abria minhas redes sociais (que mantenho desde 2011), em especial Facebook e Twitter, num computador disposto sobre uma mesa marrom-escuro num dos quartos da minha casa. Naquela tela, apareciam algumas coisas que me distraíam e punham em outra dimensão. Contudo, a realidade era insistente, carente de atenção, e não permitia que eu me esquecesse dela por mais de uma hora. E então, em certos momentos, aparecia ali a apoteose do absurdo: bandidos rindo das caras de suas vítimas ( e do país inteiro) e saindo pela porta da frente das cadeias e delegacias Brasil afora. Gente sanguinária, maldita, que ri na cara do cadáver recém-gerado por um celular de seiscentos reais pago em dez vezes a muito suor ou coisa de menor ou maior valor material.
(Quando não era por compartilhamento por pessoas no Facebook, era pelos programas policiais da TV a que minha mãe adora(va) assistir e que serviam como vozes de fundo de parte da minha rotina diária.)
  Entretanto, nesse mesmo computador—antes de eu ter meu primeiro smartphone, fato não muito distante—acompanhava os fatos políticos da nação, apesar de eu não compreender muita coisa e só começar a ensaiar algum posicionamento a partir de 2013. Neste ano (2013), fui apresentado a um certo político; não era um político qualquer, típico, com discursos enfeitados e afetados, que chegavam a ser asquerosos: tinha o falar duro, direto, que transmitia sinceridade, contra os bandidos de todos os tipos e outros absurdos que assolavam e ameaçavam nossa pátria mãe gentil, como o atentado grave contra a inocência das crianças em um dos lugares onde elas mais deveriam estar protegidas. Era o tiozão do churrasco de domingo, da pescaria no Paraíba do Sul, que tem um coração enorme e que leva sua família à Igreja todo domingo, esquecido, subjugado por uma elite (financeira, política, acadêmica, artística etc) de filhos-da-puta e perseguido por ela e seus papagaios amestrados, tendo voz e verdadeira representatividade no Congresso Nacional.
 É claro que eu me refiro a você, Jair.
 No início, eu resistia a você; sempre tive pé atrás com políticos desde quando comecei a acompanhá-los. Além do mais, eu, como muita gente, não aceitava—hipocritamente—as verdades inconvenientes, fossem elas ditas por você ou por qualquer pessoa que tivesse colhões para dizer o que tinha de ser dito.
  Entretanto, conforme eu via melhor o que se passava no mundo—com ajuda fundamental de um certo senhor de uns setenta anos, sobre o qual ainda escreverei—e o meu saco se enchia, mais eu me identificava com você, a ponto de começar a desejar uma candidatura sua( que, à época, era algo apenas virtual e um desejo de muitos que, como eu, já não agüentavam mais todas as putarias nacionais e mundiais.)
  Ainda discordo, hoje, de você em algumas coisas; mas, diante das possibilidades tenebrosas, de gente sedenta por poder e com ideais totalmente totalitários a querer escravizar a nação, isso é irrelevante. Suprimo isso pelo bem do país, dos nossos pais, mães, filhos, amigos e outras pessoas para as quais queremos um Brasil um pouco melhor.
  Sei também que, apesar de você ser Messias, não fará milagres no Planalto, caso eleito—e creio que será. São muitos os problemas nacionais, e é necessário dar prioridade ao que é realmente prioritário no Brasil; no caso, segurança e educação, pois com pessoas mortas, ameaçadas e/ou emburrecidas, nenhuma das outras questões podem ser resolvidas. E você soube elencar isso muito bem. (Este é um dos motivos por que votarei em você, além de não ter rabo preso e de toda a canalhada nacional e mundial estar-se manifestando com notícias falsas, hashtags ridículas e fluxo pesado de dinheiro para outros putos vendidos, além de outras razões mais.)
     Não precisamos ser cosplayers[1] de Policarpo Quaresma, mas podemos amar a pátria--como eu acredito amar e você já provou amar-- e trabalhar juntos(eu,presidente e todos aqueles que pensam no país)para mudar um pouquinho dela e tirá-la deste atoleiro com ajuda de Nosso Senhor Deus.
     E por falar nisso,rogo a Ele, por intermédio de Nossa Senhora, para que envie a você muitas bênçãos e que continue sendo o capitão-soldado de Nosso Senhor Jesus pela preservação de Seus Princípios aqui na terra.

                Rio de Janeiro, 03 de outubro de 2018  
                                                                                                      Yan Marinho
    

[1] Cosplayer: Indivíduo que costuma se caracterizar como um determinado personagem ou artista.

domingo, 24 de junho de 2018

Neymar e o Argumentum ad Recalquem

Neste mês,choveram--e ainda choverão-- críticas(muitas delas,justíssimas) ao Neymar. Entretanto,alguns de seus defensores mais ferrenhos(e cegos) começaram a dizer--diretamente ou via insinuações-- que os críticos tinham "inveja" daquele que,há muito,não é mais Menino da Vila(e ainda não se deu conta disso).

É claro que algumas pessoas têm uma aversão desenfreada,oriunda até de ressentimentos, ao que,atualmente,joga no futebol francês,e isso produz críticas imponderadas, que tocam em pontos irrelevantes ou mesmo totalmente desconectadas da realidade dos fatos; isto,todavia,não invalida,de forma alguma,as objeções(as justas,claro) ao comportamento ou mesmo ao desempenho neymarístico recentemente apresentado sobre o terreno gramíneo.

As tais críticas,para mim,advêm dos seguintes fatos:

1) Neymar é,atualmente,o jogador brasileiro para o qual os holofotes mais se dirigem. É natural que isso atraia babações de ovo,admirações ponderadas e...críticas,ainda mais numa sociedade cujos assuntos e gostos ainda são fortemente influenciados pela mídia de massas--a despeito da descentralização que vem sendo feita pela Internet a esse respeito,em especial pelas redes sociais;

2) Os torcedores brasileiros foram mal acostumados pelo fato de a Seleção ser pentacampeã e(por isso mesmo) de ser,até pouco tempo atrás, uma das mais temidas,que impunha um respeito até aterrorizante aos adversários. É lógico que este costume enraizado fará que a torcida pressione ainda mais por resultados,sobretudo os jogadores mais badalados e talentosos;

3) Falando sobre talento,Neymar tem um inegável,já demonstrado ao longo de quase dez anos(em termos profissionais,desconsiderados os anos de categoria de base) e visto por (milhares de) milhões ao redor do mundo.Os torcedores,até os mais sazonais,daqueles que só ligam para futebol de quatro em quatro anos,sabem bem disso,e por isso mesmo,cobram por algo que mude a história de uma partida ou que os deixe estupefatos em termos artísticos do ludopédio,coisa que só os excepcionais podem proporcionar.

Mas talento,por si só e de forma geral,não perfaz um grande jogador,ainda que seja um componente importante para que haja um. As virtudes(o texto de autoria do escritor Flávio Morgenstern diz sobre elas de forma mais completa,relacionando-as com o próprio Neymar) e o trabalho árduo(ainda que Romário me desminta com suas faltas aos treinos,entoadas por Tom Cavalcante em "Treinar pra quê" e que certamente fizeram a cabeça de Vanderlei Luxemburgo ferver à época;contudo,o Baixinho chegava na hora do vamos ver e fazia) são também necessários para quem deseja gravar seu nome na história do futebol,seja o brasileiro,seja o mundial.
O técnico Renê Simões,em 2010,disse em entrevista coletiva que o Neymar precisaria "ser educado" e que,àquela época,estavam "criando um monstro",falando até sobre as tão famosas faltas simuladas pelo atual jogador do PSG e da Seleção. O vídeo com as palavras de Simões pode ser visto abaixo:



As irretocáveis declarações do treinador,entretanto,parecem ter sido solenemente ignoradas pela imprensa,pelos árbitros,pelos outros treinadores,pelos dirigentes e pelo próprio jogador. Deu no que deu! Os paparicos protetores e exagerados de certa imprensa,dos parças e dos tais "neymarzetes"(fico pasmo com o fato de que muitos marmanjos aceitem ser chamados e até se intitulem com um vocábulo que traz consigo uma carga semântica feminina,mas isso é outra história...) continuaram desde então,resultando em óbvios mal-costume e demonstrações de afetação por parte do jogador ao receber críticas,ainda que construtivas.


Esses sujeitos dizem que gostam do "menino Ney" e  que até o amam. Permito-me discordar: se realmente o amassem,permitiriam que as críticas construtivas fluíssem sem encheção de saco(até as fariam,engrossando o coro),ajudando na própria evolução do jogador e,quem sabe,colocando-o no mesmo Panteão que Romário,Ronaldo,Ronaldinho Gaúcho,Rivelino,Pelé,Garrincha e tantos outros grandes que fizeram o Canarinho alçar vôos altaneiros em outros tempos.(Agora entendo as razões de o Canarinho andar tão putaço...)

Uma verdade desta vida precisa estar cristalina na mente de Neymar e seus defensores mais calorosos(que adoram usar o Argumentum ad Recalquem,de que tudo o que não for exaltação é inveja,é recalque):nem toda crítica é movida por inveja ou por ressentimentos;nem todo mundo quer ver o Neymar na lama. Muitos só querem vê-lo na glória de ser um campeão mundial pela Seleção e que suas expectativas de torcedor se façam reais. Mas para isso acontecer,é necessário filtrar e apreender as críticas e lidar com elas da forma mais sensata possível.
Você,Neymar,só calará a boca de muitos,inclusive a do Yan Marinho,se você apresentar algo que nos ajude a trazer o hexa,assim como Zagallo fez muitos o engolirem ao ganhar a Copa América de 1997.

Esto vir,Neymar!

sexta-feira, 22 de junho de 2018

HAICAI-CAI

HAICAI-CAI (Yan Marinho) De cobertura áurea, no leito da verde relva, cai o atacante em área.



quinta-feira, 21 de junho de 2018

Cristão Relapso(poema)

Cristão Relapso
(Yan Marinho)

Imploro-Vos, Senhor, Vosso Socorro,
imerso na escuridão do pecado,
no qual, sufocado, quase que morro;
Morte lenta a cada dia passado...

Imolo o Cordeiro com transgressões,
adio a conversão por covardia;
Senhoras minhas, hoje, são paixões,
que me dizem, com malícia: Sorria!...

Peço dolorosamente na prece,
diante de tamanha iniqüidade,
refrigério à minha alma que perece,

e clama por ordem e santidade.
Espero em Vós a fé, amor e esperança
e ir ao Reino com alma de criança...

sábado, 9 de junho de 2018

Os oito Quadrados do Inferno Funkesco


Nas profundezas além deste mundo, há um lugar bem quente, do qual o Capeta tem o domínio completo (além, claro, do domínio completo das almas que por lá fazem morada). Não, não me refiro ao baile funk do Jacarezinho: este lugar é o Inferno Funkesco.
O Inferno Funkesco é um lugar dividido em oito lotes, chamados de Quadrados (também chamados carinhosamente de Quadradinhos). Conforme o nível das transgressões às Leis de Deus ocorridas neste mundo, cada alma é encaminhada para um dos Quadrados; os primeiros são para os pecados leves e os últimos, como o sétimo e o oitavo, para os mais graves (ou para aquelas almas que cometeram uma soma de pecados de todos os tipos).
As almas que vão para cada Quadrado escutam todos os dias—e escutarão por toda a eternidade—o supra-sumo do funk carioca (e, conseqüentemente, da música brasileira).

Para haver justiça e conceder às almas um funk sob medida para cada nível infernal, há um DJ especializado, um produtor musical e uma equipe, composta por banda e técnicos de som (a iluminação é dispensável, pois nada ilumina melhor que fogo em abundância por toda a parte); esta equipe de banda e técnicos é acionada mesmo quando não há shows ao vivo, para ensaios e manutenções preventivas.

Os oito produtores musicais, certa vez, se reuniram com Satanás num encontro denominado Senta no Tridente para definir quais músicas e quais artistas ficariam em cada Quadrado. Houve bate-boca, troca de tapas e socos e até tiros de fuzil entre os produtores—já alcoolizados, pois ninguém é de ferro para agüentar uma reunião de dias a fio sem tomar umazinha-- cada um praticamente irredutível nas suas posições. Com a intervenção do Capeta (que não interveio antes porque estava se deliciando com a balbúrdia) e de seus fiéis soldados e assessores demoníacos, os ânimos outrora exaltados voltaram ao estágio civilizado—diria menos bárbaro—e um consenso foi estabelecido depois de um amplo debate de nada menos de duas semanas.

Os Quadrados assim ficaram definidos:


Primeiro Quadrado: O primeiro Quadrado é composto predominantemente pelo mulheril do mainstream do funk carioca—há homens também, como Nego do Borel--  que canta funk sem palavrões (às vezes até sem putaria); Anitta, entoando o “Vai, malandra/eu tô louca, tô brincando com o bumbum” e o “Tá fazendo tudo que eu mando/Tá achando que logo vai me ter”, é sua maior representante. Ela não fica sozinha (solteira, sim; sozinha,nunca!): Ludmilla, Jojo Todynho e outros também a acompanham;

Segundo Quadrado: Unissex, mas predominantemente masculino, reúne a nata do funk ostentação (às vezes, ficando só na ostentação mesmo, sem putaria nem apologias). “De Range Rover Evoque/Na pista eu arraso”(MC Guimê; não confunda com o gibi da Turma da Mônica!) é um notório hit do segundo Quadrado;

Terceiro Quadrado: Composto por mulheres notórias na arte da melodia da putaria; Valesca  “Quero Te Dar” Popozuda e Tati Quebra-Barraco, com seu “Dako é bom/Dako é bom” ,são as rainhas absolutas do terceiro Quadrado; mandam um beijinho no ombro para o recalque das outras intérpretes deste setor passar bem longe. Se tentar bater de frente, elas quebram o barraco com tiros, porrada e bomba, mantendo assim sua realeza nobre. Este Quadrado aloca também algumas não tão notórias, como as MCs Princesa e Plebéia(“Pirpirilimpipim da periquita/ Vou te enfeitiçar e acabar com a sua pica”) e a MC Carol, levando o “funk feminista” ao Inferno com “Meu namorado é mó otário”;     

Quarto Quadrado: Trepar, foder, meter, piroca, boceta, cuzinho, sentar e outros congêneres são vocábulos constantes do quarto Quadrado em diante. Neste Quadrado, ficam os homens que já entoaram ou vivem de fazer uma espécie de Pornhub para cegos, mas que têm algum capricho nas suas produções. MC Livinho, vulgarmente conhecido como Oliver, marca sua presença neste círculo com “Minha rola vai em você/ E quando eu colocar/Vê se geme baixinho/Pra ninguém perceber”; muitas vezes, a sacanagem aparece implícita nas letras;

Quinto Quadrado: Pornofonografia um pouco mais hardcore, mais explícita, sem tanto cuidado com a parte vocal e, digamos, musical como um todo. Aqui cabe um bom grosso (sem trocadilhos!) dos homens que vivem de produzir o bolo funkal no Brasil.  
Alguns exemplos: Mr.Catra (“Mama me olhando, vai!/Mama me olhando/Mama me olhando porque eu tô me apaixonando”); MC TH (“Tipo ginecologista/De buceta nois entende/Pergunta a ela lá se ela se arrepende”);MC Pikachu (“Tava no fluxo/Avistei a novinha no grau/Sabe o que ela quer?/Pau, pau, pau, ela quer pau”);


Sexto Quadrado: No sexto Quadrado, a Erva do Capiroto e o Pozinho Branco Maldito começam a aparecer como o oitavo Bonde das Maravilhas do Mundo Moderno; maconha e coca misturadas com piroca dão o tom neste setor do Inferno Funkesco.
Exemplo: “Teu cheiro de piranha ficou na minha roupa/Que foda gostosa que a gente fez/Fodi pra caralho e gozei na tua boca/Depois daquele skank enlouqueci de vez”(MC Juninho Life) [1] ;

Sétimo Quadrado: O tráfico de drogas e a bandidagem como um todo são exaltados como virtudes máximas; o ápice da masculinidade e da realização das almas do sétimo Quadrado. Há também o incentivo ao consumo de drogas do sexto Quadrado.
Democrático, o sétimo Quadrado aceita de famosos até zés-ninguéns que só cantam em bailes funk no morro uma vez na vida e outra na morte.
Exemplo: O plano de assaltar a casa de um coreano de classe média alta é descrito com naturalidade em “Casa do Coreano”, de MC Kauan; esta vale até colocar a letra inteira para você mesmo ver com seus próprios olhos:

Hoje o dia tá nublado
O sol tá querendo sair
Essa noite, pensativo, eu não consegui dormir
Pensando, imaginando, bolando um grande plano
Detalhes de todo canto da casa do coreano

Que tem circuito interno e é bem distante da favela
Pra dificultar entrada em cima tem cerca elétrica
Mais nois não se intimida trabalha com muita calma
A família é 4 equipe cada equipe 4 cara (então vai)

Primeira equipe é quadrilha de ladrão frentinha,
Marcio
E manquinho * parooooo falta o tom

Agora a segunda equipe os cara age numa booa
Thiaguinho vem branquinho vem lentão e vem coroa
Que a casa do coreanoo
Parece casa de filme pro assalto ficar perfeito

Nois chama a terceira equipe
Mizuno dentro do carro já preparado pra fuga
Felipe no banco de trás com William Gordão
E com Cazuza... NG, linha de frente desse aí eu não
Me esqueço, Keit; Caxa e Diego na contenção do
Dinheiro
Foi mais de 1 milhão de dólar que a família arrecadou
E com nois é o seguinte não pagou nois torturou
Isso é só bandido antigo de antigas tradições
Não conto de mil em mil é de milhões pra milhões

Mizuno habilitado e o Caxa habilitado!!
Por ser especialista invadir encapuzado
Frentinha habilitado, Manquinho habiltidado por
Especialista invadir encapuzado heeein!!

Assalto bem sucedido passo no plantão da Globo
Isso foi noticia urgente noticia pro mundo todo
Até o Datena ouviu e ficou impressionado com a
Quadrilha
Especialista invadir encapuzado
É que todos nos somos de alta periculosidade
Cada integrante do grupo é formado em faculdade
E metade do malote é gasto em baile funk e é por isso
Que eu te falo é kit de traficante...!!

É camarote fechado rodeado de mulher Ecko, Oakley na
Camisa
Na bermuda e no boné...
Alguns de camisa polo outros de cordão de elite
Alguns de 12 pino e outros de puma disk
Aqualand modelo novo com o fundo fluorescente
Sminorff na mão e a fumaça na mente...
E alguns de boné pra frente outros com boné pra trás
Cada integrante gasto uns 900 reais
Na picadilha da baixada no naipe do litoral
Salve, salve pro primeiro comando da capital...
É conceito de bandido pique uma reunião
Tu não sabe o que que isso??
É baladinha de ladrão....
Tu não sabe o que que isso??
É baladinha de ladrão....

É claro que não pára por aí: Há um MC Brisola (nome bem sugestivo em todos os sentidos!) que manda a mulher “Sentar pros Trafica”(“O 33 patrocina/Então pode vir sem medo/Senta pros trafica, pros campana e os fogueteiro”). Os exemplos se multiplicam como coelhos e ervas-daninhas.
A polícia de Satanás não combate isso, uma vez que apologia ao crime não é crime no Inferno Funkesco; os funkeiros desse tipo até ganham muito dinheiro via decretos assinados diretamente pelo próprio Capeta;





Oitavo Quadrado: Como filha-da-putagem pouca é bobagem, o Encardido e os oito produtores musicais deixaram o melhor para o final. No oitavo Quadrado vale tudo: Consumo de drogas, pedofilia (se aparecerem necrofilia e zoofilia, também poderão se estabelecer de boa no local), apologia à bandidagem e outras belezuras do tipo. Além disso, todos os outros artistas dos sete Quadrados anteriores se apresentam juntos, semanalmente e ao mesmo tempo, num festival praticamente obrigatório para eles, chamado de OitavoFest. No OitavoFest, as almas são castigadas direta e simultaneamente por Anitta, MC Kevinho, MC Carol, Ludmilla, Jojo Todynho, MC Livinho, MC TH, MC Juninho Life, MCs Princesa e Plebéia, MC Pocahontas, Dani Russo, MC Brisola e tudo o mais que houver e não houver no funk.


Este, ao menos, é o retrato da visita que fiz recentemente (6 meses atrás) ao Inferno Funkesco; o Capeta e os produtores musicais modificam periodicamente os artistas e as músicas de acordo com as tendências que lançam ao Inferno e ao mundo, mas mantendo a proporção e o tipo correspondentes a cada Quadrado.



Notas:
[1] “Skank” não é, obviamente, a banda brasileira de Minas Gerais: é uma droga derivada da maconha que é mais potente que a própria maconha em si.

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Inferno funkesco sem shows